Tributos: cerco aos ricaços
Data: 22 de junho de 2010
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O governo vai apertar a fiscalização sobre os 120 mil contribuintes pessoas físicas mais ricos do país. Pelo cronograma traçado até agora pela Receita Federal, a meta é abrir, em setembro próximo, uma delegacia especial para vasculhar as contas desse público. O posto, que contará com cerca de 60 fiscais, ficará sediado em Belo Horizonte e terá a missão de acompanhar todas as operações patrimoniais e financeiras com os CPFs dos ricaços, inclusive por meio do cartão de crédito, para averiguar movimentos atípicos com o intuito de ferir a legislação. No que depender do Fisco, todos terão o mesmo tratamento dispensado às grandes empresas.
Apesar de a Receita não detalhar o funcionamento da delegacia especial, a decisão — encabeçada pelo secretário Otacílio Cartaxo — já divide opiniões entre os especialistas quanto à sua eficácia. Para o tributarista Ilan Gorin, a medida segue a linha de aperfeiçoamento da fiscalização que a Receita promove há pelo menos dois anos, seja pela implantação de novas tecnologias ou pela revisão de procedimentos e normativos.
Em janeiro, por exemplo, o órgão criou a declaração de serviços médicos (Dmed), que obriga os prestadores de serviço desta categoria a enviarem informações sobre o atendimento de pessoas físicas em seus estabelecimentos. Na raiz da medida está o objetivo de reduzir a retenção de declarações de imposto na malha fina e, naturalmente, diminuir a incidência de fraudes e sonegação.
Gorin, no entanto, coloca em dúvida a efetividade de uma delegacia só para acompanhar grandes contribuintes. “Não acredito que será muito útil. As pessoas físicas de maior renda não são as que pagam mais”, afirmou. De acordo com o tributarista, se os contribuintes forem selecionados por patrimônio ou renda global, a lista pode ficar distorcida, pois eles pagam tributos de forma indireta. “Corre o risco de a lista cair na classe média comum, que já é alvo de uma fiscalização maior”, avaliou.
Já para Lázaro Rosa da Silva, advogado tributarista do Centro de Orientação Fiscal (Cenofisco), a criação de uma delegacia especial para o grande contribuinte vem ao encontro das discussões em torno da taxação diferenciada para grandes fortunas, assunto que tramita no Senado Federal, atualmente. “Já passou da hora de algo assim ser feito. Vai aumentar a eficiência da arrecadação e será bem-vindo”, afirmou.
Na avaliação de Silva, o cálculo, a cobrança e a fiscalização de Imposto de Renda sobre a pessoa física seriam mais eficientes se seguissem a mesma lógica adotada hoje para as pessoas jurídicas. Esses contribuintes são tributados de forma diferenciada, de acordo com o tipo e o porte do negócio. “Para a pessoa jurídica você já divide entre lucro real, lucro presumido, lucro arbitrado e o Simples Nacional. No caso da pessoa física, tributar e fiscalizar tudo junto é desrespeitar a capacidade contributiva de cada cidadão”, ressaltou.
Furo no barco
Apesar de considerarem louvável o esforço da Receita em garantir maior eficiência da arrecadação federal, com mais fiscalização e controle, os economistas lembram que a iniciativa é inócua, se não for acompanhada de mais disciplina no controle de gastos públicos. “Lembra bem a figura do cachorro correndo atrás do próprio rabo. O governo tem que aumentar a arrecadação (com mais fiscalização) para sustentar um gasto público que não para de crescer”, disse Gorin.
Segundo os cálculos do tributarista, os gastos com pessoal nos governos FHC e Lula aumentaram 70% acima da inflação média, registrada pelo Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA). As outras despesas, no mesmo período, cresceram 150% acima da inflação. “Tem que fiscalizar, tem que aumentar a arrecadação, mas é fundamental vigiar a outra ponta também. Se o governo gastasse mais energia para controlar também as despesas, seria mais eficiente”, ponderou.
Para Silva, a fiscalização mais ágil e eficiente, com maior controle, deve servir para continuar sustentando a gastança do governo. “Não conheço nenhuma esfera de governo que tenha reduzido seus gastos nos últimos anos e a única fonte de renda é a cobrança dos impostos”, destacou.
Fonte Correio Braziliense