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Lei de Falências completa cinco anos


Data: 14 de julho de 2010
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Quando entrou em vigor, em 2005, a nova legislação sobre recuperação e falências gerou enorme expectativa na classe empresarial, tendo em vista que até então, além da falência, existia como alternativa apenas a concordata. Ao longo do tempo, tendo-se demonstrado um instrumento ineficiente, a concordata pré-diagnosticava a doença e predeterminava a solução. Se a empresa tivesse a sorte de solucionar com a concordata, o caso ficava resolvido. Além disso, a concordata alcançava apenas os credores quirografários, que no peso do passivo das empresas de hoje têm pouca relevância.

Na falência, liquidam-se todos os ativos para tentar pagar todo passivo dentro de uma ordem hierárquica. Já a recuperação serve para dar à empresa em desequilíbrio uma chance de continuar operando e restabelecer seu equilíbrio entre seu passivo e seu ativo, restabelecendo o lucro.

Desde 2005, foram abertos mais de cinco mil processos de recuperação judicial no Brasil, 1.535 dos quais no ano passado. A maioria dos casos está concentrada na Região Sudeste (38%). Quanto ao número de falências, foram mais de quatro mil desde o início da nova lei. Só neste ano, os pedidos falimentares chegam quase a 500.

O levantamento foi feito nas corregedorias dos tribunais de Justiça e divulgado pelo desembargador Carlos Henrique Abrão, do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP).

Uma das críticas à lei é quanto à dificuldade de aplicação em regiões longínquas. Outro aspecto que pode ser reinterpretado pelo Judiciário é o momento da entrega das certidões negativas de débitos tributários. Entre pontos destacados como positivos está o fato de que os credores tornaram-se os agentes principais no processo de recuperação. Além disso, a lei deixa no mercado apenas as empresas viáveis para a recuperação, retirando as inviáveis.

A necessidade de rever aspectos da Lei de Recuperação e Falências é um ponto essencial para adaptá-la às dificuldades concretas enfrentadas pelos seus operadores. Essa foi uma das conclusões dos especialistas que debateram o tema no Congresso Internacional de Direito Empresarial, organizado pelo Instituto Nacional de Recuperação Empresarial (Inre), no mês de junho, em São Paulo.

Hoje, a lei inclui tributos, dívidas, entre outros passivos, que antes ficavam de fora da concordata. A partir de 2005, manteve-se a falência, mas se extinguiu a concordata, permanecendo apenas as concordatas extintas antes desse período, por direito adquirido. Então desde lá, existem duas opções: falência ou recuperação. O que chama a atenção foi a mudança de perspectiva. Na recuperação, é o credor que se identificava, e as soluções são discutidas entre os credores. Uma vez que foi acertada a solução entre credores e os devedores, o juiz faz concessão do regime.

Mesmo que o contador tenha uma posição importante na prevenção de uma falência, observar sintomas demonstrados pela empresa como sinais de enfraquecimento e indícios de que ela poderá entrar em fase falimentar pode encurtar o caminho para a recuperação. Muitas empresas perdem substância anos e anos sem que a administração tome nenhuma medida, por não enxergar a real situação dos próprios negócios. “Os gestores têm vergonha de admitir a real situação e ninguém gosta de contar a parte negativa. Mas ela existe, e se uma empresa não está indo muito bem, não significa que ela esteja condenada e mal para o resto da vida”, afirma o contador Artur João Lavies.

No ano passado, o Supremo Tribunal Federal (STF) pacificou um dos principais conflitos resultantes da Lei 11.101: estabeleceu que a competência para decidir sobre o pagamento de créditos trabalhistas de empresas em processo de falência ou em recuperação é da justiça comum, não da trabalhista.

A decisão teve repercussão geral, ou seja, a vara empresarial é o órgão do Poder Judiciário competente para decidir a respeito dos pagamentos dos créditos, incluídos os de natureza trabalhista. Além disso, a Corte declarou a constitucionalidade dos artigos que isentam as empresas compradoras do patrimônio de uma empresa em recuperação ou falência da responsabilidade por dívidas trabalhistas.
Lado social do trabalho motiva contadores

Durante processos de recuperação de uma empresa, o contador pode ser peça-chave no acompanhamento dos balancetes e na manutenção do equilíbrio das contas, passos que garantem que o plano apresentado seja mesmo executado. Ele pode atuar como perito, ou mesmo como administrador do plano de recuperação.

Experiente na tarefa de recuperar empresas e evitar falência, o contador Artur João Lavies, do Escritório Lavies, conta com o suporte do neto e advogado Márcio Lavies Bonder para atuar nos processos. A formação de uma equipe técnica multidisciplinar é, inclusive, um dos pressupostos de um plano de recuperação.

Quando um trabalho de recuperação é iniciado, deve ser observado todo o espectro da organização, e o fato social pode ser uma motivação extra para atingir a meta de recuperar uma empresa. Para Lavies, o aspecto social é determinante. “Se eu salvar uma empresa, estou salvando automaticamente o emprego de centenas de pessoas, centenas de empregos indiretos, centenas de credores.” Essa gratificação é, na opinião dele, o que mais motiva o administrador a fazer um trabalho deste tipo. “Todo contador que inicia uma atividade, seja ela qual for, vai ser novamente lembrado se ele prestou um bom serviço”, complementa. 

Uma análise minuciosa das contas de ativos, passivos, receitas e despesas e, principalmente, da evolução da empresa nos últimos cinco anos permite diagnosticar a necessidade de falência ou recuperação. A empresa vai sendo radiografada a partir dos balanços dos últimos cinco anos. Ou ela está estabilizada, ou ela passa por altos e baixos, e aí o administrador vai dar máxima atenção ao porquê dessas oscilações.

Tudo que possa gerar anomalia na análise do balanço interessa ao diagnóstico: por que a empresa perdeu mercado, se vende abaixo do custo, se está mal administrada, se existe qualquer irregularidade, fraude de natureza contábil. Também se procura saber quem eram os clientes, se continuam dando voto de confiança, se os fornecedores ainda oferecem crédito, aportam recursos quando necessário etc.

Ele explica que na recuperação a empresa tem um ano para pagar os funcionários, e depois começa a quitar as dívidas com os outros credores, em até oito anos, por pagamentos anuais. Na concordata, antes se pagava em dois anos. Eram 2/5 no primeiro ano e 3/5 no segundo. “A recuperação deu mais flexibilidade ao devedor. Esse alargamento do prazo é uma vantagem muito grande da nova lei”, afirma. A proposta da lei é justamente dar prazo compatível para que a pessoa cumpra.

Segundo o advogado Márcio Lavies Bonder, do Escritório Lavies, são vários prazos a serem atendidos pelo administrador, com uma série de responsabilidades e tarefas a serem cumpridas. O administrador, em um primeiro momento, é o fiscal da empresa, pois pediu o benefício da lei. Mas também é um executor, de prestação de contas, faz um acompanhamento mensal das finanças da empresa. Um dos pontos negativos destacado por Bonder é que a lei da recuperação se mistura com a lei das falências, e isso pode gerar confusão. Na mesma legislação, há certa dificuldade na interpretação, visto que o regramento de ambas é diferenciado. O síndico ou administrador da falência não é o mesmo da recuperação.
Passivos ficaram de fora da lei

Muito do que se esperava alcançar com o regime recuperatório acabou escapando da lei, por exemplo, as dívidas tributárias e os principais contratos bancários, como alienação fiduciária, arrendamento mercantil, cláusula de adiantamento e contrato de câmbio. Quem defende essa ideia é o procurador de justiça do Ministério Público do Rio Grande do Sul, Luiz Inácio Vigil Neto. Para ele, hoje os principais problemas na lei estão relacionados aos passivos com encargos sociais, tributos, dívidas bancárias.

Vigil explica que a lei não estabeleceu uma blindagem do devedor durante o regime do processo de falência. Entre devedor e credor, pode-se discutir que o máximo que ele fica no regime recuperatório são vinte anos. O juiz supervisiona os primeiros dois anos, os outros 18 são entre as partes envolvidas.

Neste caso, é natural que se o devedor deixar de cumprir o que se propôs, ocorre a conversão da falência. É normal também que, durante esses primeiros dois anos, os credores que não foram alcançados pela recuperação tenham o direito de pedir a falência, já que não se consegue aliviar a pressão do credor.

Como as decisões são tomadas em assembleia, são deliberadas, por maioria de votos. E são contados por crédito, e não por cabeça. Isto significa que, muitas vezes, o poder político de um credor é decisivo para decretar o resultado. Segundo Vigil, essa é uma visão econômica de democracia, e não jurídica. “Em termos de direito societário, se vota por maioria de capital. Mas em uma falência, os credores estão pensando no seu interesse próprio.”

O procurador cita o caso Varig como o grande exemplo de aplicação da Lei 11.101. A sua crise começou antes de 2005, mas ela não podia pedir concordata, pois empresas de navegação aérea não tinham este direito. Quando a lei de 2005 autorizou a pedir recuperação, ela já estava praticamente inviabilizada. Ela conseguiu evitar a decretação da falência. Mas o plano de recuperação da empresa já não era mais viável, então ela vendeu os ativos. Essa é a única forma de não pedir falência.

O fato de a lei apresentar alguns equívocos não a inviabiliza. “Ao longo desses anos, temos alguns avanços devido ao trabalho das cortes de jurisprudência. Mas ainda nos resta a tarefa de fazer pequenos ajustes, por exemplo, em relação à execução fiscal dos tributos em falência.”
Revisão ajudaria microempresas

Uma das lacunas na legislação atual é o atendimento às micro e pequenas empresas. Segundo o conselheiro-diretor do Instituto Nacional de Recuperação Empresarial (Inre), Carlos Henrique Abrão, uma emenda à lei já está nas mãos do deputado federal Regis de Oliveira (PSC-SP), que deve apresentar as mudanças ao Congresso Nacional.

Segundo ele, as micro e pequenas empresas foram desamparadas na lei. O pior é que justamente elas que deveriam ter mais garantias já que, como constatou pesquisa do Sebrae (Serviço de Apoio às Micro e Pequenas Empresas), 65% delas morrem no primeiro ano de constituição. Segundo Abrão, o pico das solicitações na área aconteceu durante a crise econômica mundial. Em 2008, foram 2.225 pedidos e em 2009, 2.940 casos. “A lei tem uma finalidade social forte, preencheu determinados setores que atravessaram a crise a partir de 2008, como o setor de agronegócios. Muitos frigoríficos e empresas do setor sucroalcooleiro se beneficiaram da lei”, disse.

As regras são distintas em cada país. Em casos de insolvência envolvendo mais de uma nação, é difícil encontrar solução única que atenda aos interesses dos credores locais, já que cada jurisdição possui uma lei e, na maioria das vezes, ela não é compatível.

O assunto esteve em debate no Congresso Internacional de Direito Empresarial: os cinco anos da lei de recuperação e falências, que ocorreu em junho em São Paulo, e para prestar depoimento, representantes dos EUA, Inglaterra, França e Alemanha relataram como a legislação é aplicada em seus países. O modelo norte-americano tem a vantagem de lastrear concordatas e antecipação de créditos e financiamentos.

Apresenta menos conflitos e pouco recurso processual e tem mais êxito na recuperação do que na quebra de empresas. Já em Londres, a lei inglesa tem natureza mais prática do que teórica e apresenta menos riscos em relação à contribuição do sistema financeiro para empresas em crise.

Em Paris, a lei francesa foi alterada várias vezes e está sob cuidado do Tribunal do Comércio, com pessoal especializado em detectar crise nas empresas. Já o modelo alemão é ágil na administração e protelação. Se a empresa não for viável, decreta-se a quebra. Dependendo da situação, tem menor ou maior ingerência do Estado.

Jornal do Comércio/RS

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