Empresas têm de reduzir exigências para ocupar vagas
Data: 10 de junho de 2013
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A dificuldade de encontrar profissionais qualificados é uma das principais queixas do empresariado brasileiro. Por outro lado, há setores em que há excesso de profissionais e por isso faltam vagas.
Para saber quais profissões estão no topo da lista de mais procurados, a Folha ouviu dez das principais consultorias de contratação do país.
O resultado da enquete indica que o apagão de mão de obra é mais acentuado nas especialidades de engenharia, mas também inclui as áreas farmacêutica, de TI (tecnologia da informação), contabilidade e RH (veja a lista completa na página 4).
Uma pesquisa da consultoria Manpower divulgada em maio mostra que 68% dos empregadores brasileiros têm dificuldades para contratar.
Com isso, o Brasil é o segundo país com mais esforço para empregar no mundo, entre 42 analisados, atrás apenas do Japão.
Por esse motivo, ganha força no país a alternativa de flexibilizar as exigências das vagas e apostar em treinamentos para desenvolver o profissional recém-contratado.
A gerente de qualidade e serviços da consultoria Adecco, Fabiane Cardoso, afirma que nas posições mais carentes uma vaga pode levar no mínimo seis meses para ser preenchida.
Cardoso diz também que não faz parte da cultura do brasileiro procurar um emprego melhor quando já se está trabalhando. Na Adecco, 85% das contratações são feitas por "hunting", ou seja, a busca do profissional que não está procurando uma vaga.
"A carência é tão grande em certas áreas que até aspectos fundamentais estão em falta, como manuseio de máquinas e programas. Portanto, quem sabe pelo menos isso tem uma vantagem grande", afirma Paulo Resende, diretor de pós-graduação da Fundação Dom Cabral.
Se é difícil encontrar profissionais qualificados em setores tradicionais, a situação é mais grave naqueles que acabaram de surgir.
É o caso do "big data" (busca e processamento de grandes quantidades de dados), área da tecnologia que mistura também estatística e planejamento de negócios.
A multinacional do setor EMC, por exemplo, só conseguiu empregar dois especialistas máximos na função, os chamados cientistas de dados. Um profissional iniciante na área ganha cerca de R$ 330 mil por ano.
Luciano Tozato, 34, um dos contratados, aprendeu a função por conta própria, já que no Brasil não há uma graduação sobre o tema.
Ele nem sequer fez ciências da computação ou estatística. Tozato é formado em administração de empresas e contabilidade, mas sempre trabalhou no mercado financeiro e teve de aprender "na marra" a usar a tecnologia para acelerar cálculos.
"Comprava livros para aprender a usar os softwares e percebi que estava nascendo um novo mundo, a análise de dados, e resolvi entrar."
O OUTRO LADO
Sobre as profissões em baixa no país, Marcelo Cuellar, gerente da consultoria Michael Page, comenta que certos profissionais podem ter dificuldade para se colocar pelo excesso de formados no país e também pelas mudanças no mercado de trabalho.
"Muitos negócios ficaram onerosos, dependem de menos pessoas ou ficaram muito antigos. Por isso, o formado nessas áreas que não flexibiliza sua atuação corre sérios riscos de desemprego."
Para as empresas, há ao menos duas opções rápidas para resolver o problema da falta de mão de obra: tirar profissionais já empregados de outras companhias ou contratar especialistas estrangeiros. O problema é que isso sai caro. Por isso, elas têm optado por reduzir as exigências para algumas vagas.
"Atendemos muitos casos de empresas que já optam por não contratar o candidato 100% ideal. Elas assumem a formação extra dos profissionais que têm bom potencial ou perfil próximo do procurado", afirma Márcia Almström, diretora da consultoria Manpower.
A montadora Nissan, que no fim de 2013 vai iniciar as operações de uma fábrica em Resende (RJ), está fazendo isso. Osiel Nobre de Jesus, 41, por exemplo, foi contratado neste ano para o cargo de "high skilled operator", ou seja, especialista em serviços manuais, no seu caso para trabalhar com pintura e polimento.
Ele conta ter apenas o ensino médio completo, mas conseguiu a vaga por já ter trabalhado em fornecedoras de montadoras. "Em minha carreira já fiz muitas coisas diferentes, tive até uma experiência como dono de uma pequena oficina."
A gerente de recrutamento e seleção da Nissan, Andrea Ianni, afirma que mantém conversas com cada gestor da fábrica para flexibilizar as exigências por causa da grande dificuldade de achar profissionais. "Aspectos como fluência em idiomas ou tempo de experiência são suavizados. Esses funcionários recebem treinamento antes de assumirem o posto."
CONTABILIDADE
Controladoria ganha força com lentidão da economia
Profissionais coletam e analisam dados da empresa e indicam o caminho para cortes e investimentos
A economia brasileira está crescendo menos que o esperado --o PIB avançou 0,6% no primeiro trimestre deste ano, abaixo da expectativa do mercado, que era de 0,9%.
Com isso, cresce nas empresas a importância de profissionais de controladoria, que indicam o caminho para cortes de gastos, restruturações e investimentos.
"Em 2011, as empresas investiram pesado em projetos e em produção. O problema é que os resultados esperados não vieram. Por isso, em 2013, procura-se compensar essa baixa por meio da reorganização dos custos", afirma Lucas Toledo, gerente-executivo da consultoria Michael Page.
Um levantamento da empresa indica que os chamados controllers, que são responsáveis pelo planejamento econômico-financeiro das companhias, são um dos mais procurados hoje.
Os salários oferecidos variam entre R$ 8.000 e R$ 25 mil para cargos de alta e média gerência.
Outro fator que justifica a demanda para esse cargo é a adoção no Brasil do IFRS, que é um conjunto de normas internacionais de contabilidade que visa uniformizar os procedimentos do setor.
A questão é que o Brasil vive uma carência de profissionais capacitados para assumir esse tipo de posto. A função deles é reunir informações financeiras, corporativas, tributárias e legais da organização e, a partir de uma análise criteriosa, munir a alta de direção de dados para a tomada de decisão.
O controller, em geral, tem formação em ciências contábeis com sólidos conhecimentos em administração de empresas, economia, finanças e tributação.
É desejável, também, que ele tenha uma boa visão geral do negócio da empresa, capacidade analítica e habilidade de se comunicar bem com todos os departamentos.
E ser um bom negociador, já que parte do trabalho é fazer com que os gestores de cada área aprovem os projetos formulados por ele.
Para ocupar a função, não é suficiente "dialogar com números", ou ser apenas a pessoa que tem a "chave do cofre", afirma David Kallas, diretor-executivo da Anefac (Associação Nacional de Executivos de Finanças Administração e Contabilidade).
"É preciso debater ideias, discutir saídas e entender o métier' da empresa."
MENOS BUROCRACIA
Mirelle Filomeno, gerente da consultoria Manpower Specialist, diz que a dificuldade de encontrar esse tipo de profissional está relacionada a uma mudança de cultura em relação à função dos profissionais de controladoria nas empresas.
"A visão do contador até então era de uma pessoa meramente burocrática", afirma. "O profissional precisa sair do papel operacional e ter uma visão mais estratégica. Não havia essa cultura no Brasil, por isso estamos com dificuldade de encontrá-los."
Carlos Valeriano, 34, controller da unidade de negócios da consultoria Accenture, tem um currículo clássico do que é exigido pelas empresas para o cargo.
É formado em ciências contábeis, fez cursos de extensão em negócios e mestrado profissional em administração de empresas. Ele também fala inglês e espanhol.
"Entender de contabilidade me ajudou profundamente, mas eu precisei adquirir uma base diferente, que me ajudaria a pensar a fundo o negócio em cada projeto em que estou envolvido", conta. "É fundamental que um controller saiba transformar informações em estratégia."
FALAR DE NÚMEROS
Hoje à frente de uma equipe de 11 pessoas distribuídas por escritórios no Brasil e na Argentina, Valeriano acostumou-se a buscar profissionais no mercado, de preferência com um perfil que combine as habilidades comportamentais e técnicas. Contudo, sabendo da realidade do ramo, ele admite que essa nem sempre é uma tarefa fácil.
"Muitos acham que são bons tecnicamente, mas não têm a inteligência emocional para administrar situações", afirma. "Saber se comunicar é algo importantíssimo."
Ter pleno domínio do inglês também é essencial. "É importante ter uma segunda língua, já que reportamos nossa situação econômica à matriz [da multinacional]", conta José Othon de Almeida, líder de um programa da Deloitte no Brasil para formação em finanças e negócios de gestores da empresa.
A formação inicial ideal para ocupar o cargo é um ponto bastante discutido.
Embora o profissional possa ser oriundo de outras áreas, como administração de empresas, economia ou finanças, exige-se que ele disponha de uma base de ciências contábeis, uma vez que assinará os balanços e dados de prestação de contas da organização.
Essa é uma das questões que justifica a escassez de profissionais nessa área.
"Até pouco tempo atrás, só havia um programa de doutorado em contabilidade no Brasil. O resultado é que temos no mercado profissionais com uma formação carente demais para assumir o cargo de controller", afirma Samy Dana, professor da FGV.
Daniel Iwata, 33, que ocupa o cargo no Grupo Voitel, é graduado em administração de empresas com especialização em gestão.
Ele diz que foi aprendendo na prática a área de finanças nas organizações em que trabalhou, como CTIS e Telefônica.
"Consegui agregar muito à minha bagagem trabalhando nos departamentos de finanças, atuando em gestão de custos e planejamento. Aprendi a ser estrategista, unindo a parte técnica com a a habilidade para os negócios", afirma.
Conheça os 15 profissionais mais procurados do país
REINALDO CHAVES
A Folha ouviu as consultorias Michael page, Robert half, Adecco, Quality Training Recursos Humanos, Robert Walters, Mercer, Mariaca, Asap, 2get e Manpower para descobrir os 15 profissionais mais em falta no país na atualidade.
Fonte: Folha de S.Paulo