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Nova definição de controle mexe com balanço de incorporadoras


Data: 13 de junho de 2013
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As incorporadoras mudaram de tamanho no primeiro trimestre - e não foi apenas por causa do ritmo de lançamentos ou da perda de fôlego da economia. Levantamento feito pela consultoria Ernst & Young com base nas demonstrações contábeis de oito empresas do setor mostra que as receitas encolheram em média 4% no período apenas por conta da adoção do conjunto de normas que altera o conceito de controle e a contabilização de empreendimentos administrados em parceria.

 

Porém, ao contrário do observado nos setores de energia elétrica e aluguel de propriedades comerciais, que também trabalham com muitos projetos em associação, no segmento de incorporação a tendência geral não foi de "redução" dos balanços. Na amostra considerada pela E&Y, os efeitos foram díspares. Enquanto a Tecnisa viu sua receitas minguarem 12%, o faturamento da Helbor cresceu 20% só pelo efeito das novas normas. Outras empresas, como Cyrela, PDG e Direcional tiveram pouco impacto na primeira linha do balanço.

 

Na prática, o que ocorreu foi que algumas empresas do setor se viram donas de empreendimentos dos quais não reconheciam o controle pelas normas anteriores - e vice-versa. Pela regra vigente até o ano passado, os projetos controlados em conjunto, as joint ventures, podiam ser contabilizados linha a linha nas demonstrações de resultados, de acordo com a participação no capital da empresa investida e essa era opção amplamente adotada. No modelo, conhecido como consolidação proporcional, se uma companhia tinha uma fatia de 50% em um empreendimento, contabilizaria metade de suas receitas, custos, despesas, ativos, passivos e assim por diante.

 

Pelo IFRS 11, que passou a ser obrigatório neste ano, as joint ventures passaram a ser contabilizadas pelo método de equivalência patrimonial e entram em apenas uma linha no balanço. Nada muda no lucro e nem no patrimônio, mas há redução de receitas, custos e despesas. Ativos e passivos também podem sofrer alterações significativas. A expectativa, portanto, era de que as empresas "encolhessem".

 

Mas uma revisão no conceito de controle, introduzida pelo IFRS 10, que também entrou em vigor neste ano, trouxe um efeito inesperado. Anteriormente, o controlador era quem, independentemente da participação acionária, definia as políticas financeiras e operacionais da investida. Agora, o controle está nas mãos daquele que tem o poder de gerir as atividades relevantes e que afetam os retornos variáveis do projeto.

 

Dois termos nessa definição foram suficientes para produzir uma revolução nos balanços das construtoras. O primeiro é o "poder de gerir". Ainda que uma das partes atualmente não esteja no comando das principais decisões no dia a dia, se o contrato, no momento de sua constituição, prevê que ela possa influenciar de forma significativa essas decisões, há controle.

 

O segundo ponto foi ainda mais relevante para as incorporadoras: a definição de atividades que geram os principais retornos. Nas parcerias formadas para empreendimentos imobiliários, as atividades relevantes são construção e financiamento: se o contrato prevê que uma determinada empresa é que tem o poder se interferir sobre essas atividades, ela é a controladora. As demais atividades são consideradas "acessórias".

 

De acordo com Paul Sutcliffe, sócio responsável pela área de IFRS da E&Y e coordenador do levantamento, os dois efeitos foram observados para a maior parte das empresas. Houve empreendimentos que mantiveram o status de joint ventures e passaram a ser contabilizados por equivalência patrimonial. Outros projetos que eram classificados como operados em conjunto passaram a ter um controlador definido, e a consolidação foi integral. "No fim das contas, em algumas empresas, um efeito falou mais alto que o outro", afirma.

 

No caso da Cyrela, 49 empreendimentos mantiveram o status de joint ventures, enquanto outros 29 passaram a ser considerados como controlados, o que compensou o impacto na primeira linha do balanço: o efeito na receita foi de apenas 1%. Já a Helbor, que registrou o maior salto na receita pela adoção das novas normas, a companhia se viu controladora de pelo menos 45 projetos a mais do que no modelo anterior.

 

Nesses casos, o resultado do projeto é consolidado integralmente no balanço, linha a linha: 100% das receitas, custos e despesas são incorporados ao balanço do controlador. A diferença referente à fatia do capital não detida é retirada na apresentação do lucro dos não controladores.

 

Os profissionais ouvidos pelo Valor afirmam que houve alguma resistência dos empresários em relação às novas normas. "Houve algumas discussões mais 'apimentadas' porque os empresários se julgavam controladores apenas por mandar no dia a dia", afirma Sutcliffe, da E&Y.

 

De acordo com Alessandro Cassini, da Deloitte, a intenção por trás da novas regras foi adotar uma política mais conservadora nos balanços: "Numa joint venture, não necessariamente uma empresa tem acesso às receitas, ao caixa e aos ativos que consolidava antes no balanço", afirma. Mas, segundo ele, muitos empresários afirmaram que o novo modelo não reflete bem a cara do negócio.

 

"O IFRS 10 é altamente conceitual e é muito menos prático que a norma antiga", afirma Ramon Jubels, sócio do departamento de práticas profissionais da KPMG. Segundo ele, aplicar o IFRS 10 a cada uma das centenas de contratos de parceria firmados pelas empresas exigiu um esforço comparável à adoção das normas contábeis internacionais, na virada de 2009 para 2010.

 

A Rossi não conseguiu se adequar às novas normas a tempo e publicou seus números do primeiro trimestre ainda sob o modelo antigo. O balanço, auditado pela Deloitte, levou uma ressalva, o que indica que há inconsistências relevantes em relação aos padrões contábeis. Procurada pela reportagem, a Rossi informou que está em processo de avaliação das parcerias e que a expectativa é que no segundo trimestre as normas já sejam aplicadas.

 

 

Mudanças de regras causam confusão


As novas normas para definição de controle e contabilização de empreendimentos em conjunto causaram muita confusão no mercado. O entra e sai de projetos nos balanços e a falta de clareza sobre os impactos da adoção dos IFRS 10 e 11 deixaram investidores e analistas no escuro sobre o desempenho efetivo das companhias no começo do ano.

 

As maiores queixas vieram do setor de energia elétrica, no qual os efeitos das medidas do governo para reduzir a conta de luz já geraram distorções significativas. "É praticamente impossível saber o que foi efeito de reavaliação de ativos regulatórios, dos novos preços praticados pelas empresas e ou das novas regras de consolidação", afirma o analista de um banco de investimento.

 

No setor, foram poucas as empresas que divulgaram comparativos sobre o que seria o balanço sob as regras antigas. Por essa razão, a Ernst & Young não conseguiu medir o impacto das medidas para o segmento neste ano. A conta só foi possível para o primeiro trimestre de 2012, comparando os dados apresentados no ano passado e reapresentados neste ano, já sob a vigência das novas regras.

 

Em relatório, o analista Antonio Junqueira do BTG Pactual afirma que, no balanço da Cemig, R$ 4 bilhões de dívidas "sumiram" sob as novas regras de consolidação, mas não houve divulgação de mais detalhes sobre a redução. "Com base no que foi divulgado, é difícil dizer com alguma clareza ou confiança o que realmente aconteceu", afirmou à época da divulgação dos resultados da estatal mineira.

 

Com as novas regras de contabilização, projetos importantes para a estatal mineira, como a Light, a transmissora Taesa e a usina de Belo Monte são agora contabilizadas como equivalência patrimonial, com impactos em receita, dívida líquida, Ebitda e margens, lembra Sérgio Tamashiro, do J. Safra em boletim aos clientes.

 

No setor de construção civil, a transição foi um pouco mais fácil, afirma Guilherme Vilazante, do Bank of America Merrill Lynch (BofA). "Tem ativos importantes que a gente não enxerga mais. Temos que buscar a informação nas notas e refazer algumas contas para fazer a análise por fluxo de caixa", afirmou o analista, para quem a mudança "atrapalhou, mas não comprometeu" a análise.

 

Em teoria, o IFRS 12, que também entrou em vigor neste começo de ano, exige que as empresas abram uma série de informações nas notas explicativas a respeito de suas joint ventures, coligadas e outras investidas que são contabilizadas por equivalência patrimonial. Na prática, no entanto, os analistas afirmam que as explicações, muitas vezes, não são suficientes.

 

Segundo auditores que acompanharam o processo adaptação às novas regras, a tendência é que as empresas se aperfeiçoem na divulgação de informações de suas subsidiárias. "É tudo muito recente e os impactos foram significativos. Para atrair o investidor, as empresas vão ter de detalhar melhor os projetos", afirma Danilo Simões, sócio do departamento de práticas profissionais da KPMG.

 

A aplicação do IFRS 12 também vai de encontro à tendência de tentar reduzir o tamanho das demonstrações financeiras - cada vez mais inchadas por um número sem fim de notas explicativas. "O IFRS 12 não é exatamente um exemplo de como simplificar as coisas", afirma Ramon Jubels, também da KPMG.

 

Alexandre Cassini, da Deloitte, lembra que, nesse caso, entra novamente o embate entre quantidade e qualidade. "A empresa tem que prestar as informações que têm utilidade para o investidor, para o analista. No caso do IFRS 12, as informações sobre a controladas são imprescindíveis. É o tipo de informação que agrega", afirma. (NV)

 

Opiniões bem-vindas na hora certa

Por Fernando Torres | De São Paulo

Há uma semana, Amaro Gomes, único brasileiro a integrar a diretoria do órgão que elabora as regras do IFRS, recebeu um telefonema. Do outro lado da linha estava um executivo de uma grande organização brasileira pedindo o retorno da possibilidade de se usar o método da consolidação proporcional para refletir o investimento em joint ventures. "Eu perguntei se ele havia enviado uma carta-comentário quando a discussão foi feita em audiência pública, e ele disse que não", relatou Gomes, que insiste na necessidade de os brasileiros participarem mais das discussões do Conselho de Normas Internacionais de Contabilidade (Iasb, na sigla em inglês).

 

A essa altura, diz ele, o assunto da consolidação proporcional já é passado dentro do Iasb. "Eu me sinto até repetitivo sobre esse tema. Mas a participação da América Latina e do Brasil no processo de elaboração das normas está muito, muito aquém da nossa importância econômica, da capacidade técnica e da diversidade das nossas empresas" afirmou ele, que participou nesta semana da 3ª Conferência Brasileira de Contabilidade e Auditoria Independente, em São Paulo.

 

Para Gomes, a cultura latina de deixar as coisas para a última hora talvez explique esse tipo de comportamento.

 

Entre os temas em discussão atualmente no Iasb, diz ele, estão os contratos de leasing, cuja audiência pública está aberta e termina em 13 de setembro. Gomes lembra que a norma deve afetar de forma significativa não apenas as arrendadoras, mas também as arrendatárias e mesmo empresas que tenham apenas contratos de aluguéis tradicionais. Pela regra proposta, todos esses contratos deverão estar "dentro" dos balanços das empresas, tanto no ativo, como direito de uso, como no passivo, como uma obrigação.

 

Além desse tema, o Iasb espera dar um passo relevante neste mês, com a publicação da minuta para audiência pública da norma sobre contratos de seguros, cuja discussão já dura 12 anos dentro do órgão. Também deve ser publicada nas próximas semanas a norma definitiva sobre reconhecimento de receita, que entra em vigor em 2015.

 

Outro debate que segue quente é aquele relacionado com as propostas do Iasb e do seu congênere americano Fasb, responsável pelo padrão contábil US Gaap, sobre registro de provisões para inadimplência em empréstimos.

 

Segundo Gomes, a maior preocupação de bancos e investidores com relação às propostas não tem relação com aspectos conceituais ou técnicos dos métodos sugeridos. "A principal questão tem sido a falta de convergência entre os modelos."

 

A proposta americana prevê que seja registrada a perda esperada para toda a vida do contrato na data de concessão do empréstimo, enquanto a sugestão do Iasb é que a provisão inicial se refira apenas à inadimplência prevista para 12 meses. Ainda na proposta para o IFRS, somente se houver uma deterioração na qualidade do crédito do tomador ao longo da vigência da operação é que o restante da provisão seria constituída.

 

Na prática, a proposta do Fasb antecipa e eleva de forma relevante o registro das provisões.

 

"A mensagem principal que tenho recebido é que Fasb e Iasb têm que convergir. E convergir para um modelo que não seja tão rígido quanto o do Fasb em termos de provisão. Não dizem que tem que ser o do Iasb. Mas não querem o do Fasb", afirmou Gomes.

 

No Brasil, os bancos usam o modelo que também prevê o registro de uma provisão mínima já na data de concessão do crédito, conforme a escala de rating atribuída à operação, que pode variar de AA a C. Os índices variam de zero a 3% do valor.

 

De acordo com Gomes, que era funcionário do Banco Central antes de ir para o Iasb, o modelo usado no Brasil é bastante semelhante, em termos de teoria, ao que está sendo proposto pelo Iasb. "A diferença é que aqui o regulador estabelece um percentual mínimo de provisão, que pode ser igual, menor ou maior do que a perda esperada, levando em conta as características da operação", afirmou o membro do Iasb.

 

O período de audiência pública da proposta para registro de provisões para perdas em empréstimos termina no dia 5 de julho. Ainda dá tempo de participar.


Fonte: Valor Econômico

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